Titus Andronicus, William Shakespeare

Titus Andronicus. Supostamente a primeira tragédia de Shakespeare, bastante sangrenta e com uma primeira cena longa, intensa e repleta de reviravoltas, pedra fundamental de toda a trama. Em alguns momentos, como seria natural que acontecesse, deixa transparecer a cultura elisabetana interferindo na sua visão do universo romano. No entanto, cumpre com grande eficácia sua função de catarse, e por diversos momentos chega a provocar o horror. É possível que Titus (o desafortunado general romano que volta triunfante para casa mas, logo em seguida, mergulha num ciclo de desgraças que parece não ter fim) possa ser tomado como um protótipo para o desaventurado rei Lear; assim como Tamora, a rainha goda desposada pelo recém empossado imperador romano, pode ser relacionada ao arquétipo de Lady Macbeth; e o pérfido mouro Aaron ao arquétipo de Iago (de Otelo); a tradutora Barbara Heliodora tece elucidativo comentário sobre isso logo no prefácio. Também não deixa de ser curioso que a maneira como foi desenvolvida a brutalidade da peça, repleta de vinganças, assassinatos, mutilações, decapitações, estupro, canibalismo involuntário etc., tenha me feito pensar em várias obras cinematográficas contemporâneas, como alguns filmes de Quentin Tarantino, por exemplo, Cães de Aluguel e Os Oito Odiados, sobretudo. Há bastante controvérsia se Titus Andronicus tenha sido realmente uma peça escrita por Shakespeare. Se a considerarmos de sua lavra, teríamos o bardo inglês ainda em seus primeiros passos, mas já indicando os vislumbres de uma longa estrada que, indo muito além de sua época, revelava a inquietude e a insensatez humana.
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| Publicado originalmente em dezembro de 2016, no blog Ágora da Taba.

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